O Junho Violeta é mais do que uma campanha de conscientização. É um chamado para olhar de frente uma realidade que ainda preferimos esconder: a violência contra idosos. Ela acontece nos lares, nas instituições, nos bastidores da vida adulta, onde o cuidado deveria ser sagrado e, muitas vezes, se transforma em abandono, exaustão ou agressão.
Mais do que lembrar que dia 15 de junho é o Dia Mundial de Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa, a campanha Junho Violeta convida a sociedade a refletir sobre o modo como tratamos quem já viveu tanto. E o quanto ainda precisamos evoluir nesse cuidado.
Violência contra idosos: mais comum e complexa do que parece
A violência contra idosos não é só física. Ela pode ser emocional, financeira, institucional. Pode acontecer através da negligência, do excesso de medicamentos, da infantilização ou da simples ausência de escuta. Pode vir disfarçada de impaciência, de piadas, de indiferença. Pode ser cometida por desconhecidos, por cuidadores ou por membros da própria família.
No Brasil, mais de 47 mil denúncias foram registradas pelo Disque 100 só em 2023, segundo o Ministério dos Direitos Humanos. E sabemos que esses números são apenas a ponta do iceberg. Muitos casos nunca são denunciados, especialmente quando envolvem relações de afeto ou dependência.
Nos Estados Unidos, uma em cada dez pessoas com mais de 60 anos já sofreu algum tipo de abuso, segundo o National Center on Elder Abuse (https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Violência_contra_a_pessoa_idosa?utm_source=chatgpt.com). No Japão, as denúncias aumentaram durante a pandemia, com destaque para casos entre familiares, conforme mostra a NHK World-Japan (https://www.reddit.com/r/japannews/comments/16s50qn/editorial_japans_familybased_social_system/?utm_source=chatgpt.com).
Cuidadores familiares: entre o amor e a exaustão
Um ponto delicado dessa discussão é o sofrimento silencioso de quem cuida. Grande parte dos idosos dependentes é acompanhada por familiares que se tornam cuidadores. Sem formação, sem apoio, sem descanso.
A sobrecarga é física, emocional e financeira. Segundo estudo da Fiocruz, muitos cuidadores familiares desenvolvem ansiedade, depressão e quadros de exaustão profunda. Em alguns casos, esse desgaste pode até se transformar em atitudes agressivas, não por maldade, mas por puro esgotamento (https://fiocruz.br/noticia/2024/04/pesquisa-mostra-que-situacao-de-cuidadoras-de-idosos-se-agravou-na-pandemia?utm_source=chatgpt.com).
A pergunta que fica é: quem cuida de quem cuida?
Criar redes de apoio emocional e práticas de autocuidado para esses cuidadores é uma parte essencial da prevenção da violência contra idosos. Ninguém dá o que não tem. O cuidado precisa de sustentação, precisa de fôlego, precisa de escuta.
Experiências que mostram caminhos: o envelhecimento pode ser diferente
Na Suécia, por exemplo, o envelhecimento é tratado como uma fase ativa da vida. O governo oferece casas adaptadas, equipes multidisciplinares, transporte gratuito e acesso à cultura. Tudo isso não apenas para garantir segurança, mas para preservar autonomia e sentido.
Aqui no Brasil, algumas iniciativas também merecem destaque. Em Fortaleza, o projeto Viva a Terceira Idade oferece atividades físicas, oficinas de memória, rodas de conversa e acolhimento psicológico para idosos da rede pública. Seu José, de 78 anos, que participa do programa, conta: “Achei que minha vida tinha acabado depois da aposentadoria. Agora eu tenho vontade de acordar”(https://www.fortalezaamigadoidoso.com.br/o-projeto/?utm_source=chatgpt.com)
Esses exemplos mostram que o envelhecimento pode sim ser uma etapa rica, viva, cheia de troca. Mas para isso, precisamos transformar nossa cultura do descarte em cultura do cuidado.
Junho Violeta e o convite à escuta profunda
Inspirados por autores como Carl Rogers, que via o cuidado como uma prática de presença e aceitação, o Junho Violeta nos lembra que a escuta pode ser revolucionária. Quando escutamos de verdade, acolhemos não só as palavras, mas também a dor por trás do silêncio. A solidão por trás da agressividade. O medo por trás do esquecimento.
O envelhecimento saudável só é possível em ambientes onde o idoso é respeitado como sujeito. Onde não é infantilizado, silenciado nem afastado das decisões que dizem respeito à sua própria vida.
O que podemos fazer agora?
Reconhecer sinais de abuso é essencial. Mudanças bruscas de comportamento, hematomas, medo constante, falas incoerentes ou apatia podem ser sinais de violência. Se você testemunhar ou suspeitar de algo, denuncie pelo Disque 100 ou procure o CRAS mais próximo.
Mas mais do que denunciar, é preciso transformar. Criar espaços de convivência, políticas públicas eficazes, programas de suporte emocional, e principalmente, mudar o olhar sobre a velhice.
O Junho Violeta é um lembrete de que ninguém deveria terminar a vida se sentindo um fardo. Todo corpo envelhece, o seu e o meu e toda vida merece respeito. E todo cuidado começa quando decidimos escutar.